sexta-feira, 10 de julho de 2015

"A NATUREZA EM PERIGO"


Abelhas do Hemisfério Norte são 'espremidas' pelo aquecimento global

Fábio de Castro - O Estado de S. Paulo
09 Julho 2015 | 

Segundo estudo, as abelhas perdem terreno nas áreas mais quentes, ao sul, mas não colonizam novas áreas ao norte



Em Nottingham, Inglaterra, uma abelha visita uma flor para sugar o nectar, levando o pólen de uma planta para outra.
Em Nottingham, Inglaterra, uma abelha visita uma flor para sugar o nectar, levando o pólen de uma planta para outra.

A extinção de abelhas na Europa e na América do Norte é mesmo consequência do aquecimento global, de acordo com um amplo estudo feito por um grupo internacional de pesquisadores e publicado nesta sexta-feira, 9, na revista Science. As abelhas estão sofrendo um processo de extinção em todo o mundo, mas, pelo menos no Hemisfério Norte, os cientistas descartaram causas como o uso intenso de agrotóxicos ou mudanças no uso da terra.

Já se sabia que a elevação das temperaturas médias no planeta está levando uma série de espécies de animais e plantas a perder espaço nas áreas mais quentes, ao sul do Hemisfério Norte e a buscar novos hábitats nas regiões mais frias, ao norte. Mas, segundo o novo estudo, o caso das abelhas é diferente: elas estão sumindo no sul e não estão colonizando novas áreas ao norte. A pesquisa indica que elas estão sendo comprimidas em um espaço cada vez menor e já perderam uma faixa de 300 quilômetros de habitat nos dois continentes.

"O aquecimento global encurralou espécies de abelhas em uma espécie de 'morsa' climática. O resultado é uma dramática perda de espécies de abelhas nas áreas mais quentes dos dois continentes. Para espécies que evoluíram em condições frias, como as abelhas, o aquecimento global pode ser o tipo de ameaça que causa o desaparecimento de várias delas para sempre", disse o autor principal do estudo, Jeremy Kerr, da Universidade de Ottawa (Canadá).


Infográfico mostra como o aquecimento global levou as abelhas a perderem espaço, em relação a outras espécies, nas regiões meridionais da América do Norte e Europa: elas já foram "espremidas" 300 quilômetros para o norte
Infográfico mostra como o aquecimento global levou as abelhas a perderem espaço, em relação a outras espécies, nas regiões meridionais da América do Norte e Europa: elas já foram "espremidas" 300 quilômetros para o norte


Para solucionar o problema, os autores do estudo sugerem uma solução radical: mover populações de abelhas para novas áreas onde elas poderiam sobreviver. De acordo com eles, esse tipo de "migração assistida" tem sido considerada controversa, mas cada vez ganha mais espaço à medida que o aquecimento global se intensifica."Ao contrário de muitas outras espécies, as abelhas não se expandiram para áreas mais ao norte. Nós precisamos de novas estratégias para ajudá-las a enfrentar a mudança climática causada pelos humanos. Talvez tenhamos que ajudar as abelhas a estabelecer novas colônias ao norte, em escala continental", disse Kerr.

Para estudar a resposta das abelhas às mudanças climáticas, a equipe de 14 cientistas liderada por Kerr investigou, em museus, dados de 67 espécies de abelhas feitos nos últimos 110 anos na América do Norte e na Europa, examinando mais de 420 mil registros históricos e atuais. As mudanças de cada espécie de abelha para o norte nas últimas décadas foi comparada com os movimentos das abelhas entre 1901 e 1974, quando as temperaturas eram mais baixas. Com isso, eles descobriram que nas décadas mais recentes, mais quentes, as abelhas não se mudaram para o norte. Ao mesmo tempo, elas desapareceram das faixas mais meridionais em que antes estavam presentes.

Os cientistas também avaliaram o papel de outros fatores além da mudança climática - como mudanças no uso da terra e aplicação de pesticidas - na perda de habitat das abelhas. Mas não encontraram nenhuma correlação considerável. "O desaparecimento das abelhas das áreas mais quentes ocorre da mesma maneira quando não há uso de pesticidas ou intensificação da agricultura. Mas sabemos que os extremos climáticos cada vez mais frequentes, como ondas de calor, podem atingir duramente essas espécies e a mudança climática produz ameaças que já estão sendo sentidas", disse Kerr.

Segundo o estudo, o encolhimento do habitat das abelhas tem sérias consequências ambientais e econômicas, já que elas polinizam diversas plantas que são importantes para alimentar humanos e animais. De acordo com Kerr, caso as abelhas continuem a desaparecer, é provável que o mercado de alimentos sofra o impacto de preços mais altos e redução de variedades. "Os polinizadores são vitais para a segurança alimentar e para a nossa economia. A perda de polinizadores terá impactos negativos nas duas áreas", disse. "A coisa mais importante que podemos fazer é começar a promover ações sérias para reduzir a taxa de mudança climática", afirmou Kerr.

Os autores do estudo ainda não têm uma explicação conclusiva para o fato de as abelhas não ganharem espaço nas regiões mais frias à medida que perdem terreno no sul, como acontece com algumas borboletas, por exemplo. A hipótese mais provável, segundo eles, é uma questão evolutiva. Diversas outras espécies de insetos se originaram e se diversificaram em climas tropicais e, ao passo que as temperaturas sobem, sua história evolutiva permite que elas se adaptem. As abelhas, porém, têm "origens evolutivas incomuns, em regiões frias", segundo o artigo. De acordo com os autores, um terço das espécies norte-americanas de abelhas estão em declínio e algumas delas já foram reduzidas em 90%.

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